UE publica Relatório Anual sobre os Direitos Humanos e a Democracia no Mundo 2024

“Em 2024, assistimos a níveis extraordinários de hostilidade em relação à democracia, desde a desinformação desenfreada e a manipulação da informação por parte de actores estrangeiros, ao silenciamento dos meios de comunicação social e dos defensores dos direitos humanos, e a um forte recuo na igualdade de género e a diversidade, anulando anos de progresso em muitos países. Actualmente, apenas 29% da população mundial vive em democracias liberais. No centro destes desafios está a paz. A paz não é simplesmente a ausência de guerra. É o cultivo activo da justiça, a protecção dos mais vulneráveis, a concretização de todos os direitos humanos e o empenho no diálogo e na reconciliação" - Alta Representante, Kaja Kallas.

Moçambique: Panorama da situação dos direitos humanos e da democracia

Embora a situação de segurança em Cabo Delgado tenha melhorado em 2023, em 2024 a violência voltou a aumentar, particularmente no período em que as forças SAMIM, da SADC, deixaram o país, em Julho de 2024. Os grupos armados continuaram a perpetrar graves violações e abusos dos direitos humanos, ataques violentos, recrutamento de crianças, raptos, decapitações e violência sexual e baseada no género contra mulheres e raparigas. Jornalistas moçambicanos e internacionais foram severamente restringidos no seu trabalho, em particular em Cabo Delgado. No decurso de 2024, a situação geral dos direitos humanos e da democracia em Moçambique deteriorou-se ainda mais. Esta deterioração foi em grande parte causada por uma crise de segurança e humanitária no Norte e por uma onda de violência pós-eleitoral que atingiu o país após as eleições de 9 de Outubro de 2024.

As eleições presidenciais, legislativas e das assembleias provinviais tiveram lugar em 9 de Outubro de 2024 e foram marcadas por irregularidades generalizadas. A estas eleições seguiu-se uma agitação civil sem precedentes. As forças de segurança envolveram-se numa violência indiscriminada, os manifestantes em actos de pilhagem e vandalismo. O assassinato de duas figuras da oposição política e o anúncio dos resultados provisórios em 24 de Outubro irritaram ainda mais a população. Nos finais de Dezembro de 2024, cerca de 300 pessoas tinham sido mortas, incluindo vítimas nas forças policiais, e milhares tinham sido feridas ou detidas. Em finais de Dezembro de 2024, mais de 700 mil pessoas continuavam deslocadas no interior do país, em consequência a insegurança em curso nas províncias do norte e de catástrofes naturais como ciclones e inundações nas províncias do centro. Os activistas e os defensores dos direitos humanos, que trabalham num ambiente muito complexo, foram frequentemente vítimas de intimidação, rapto e assassínio - crimes que ainda não foram investigados. Tanto a violoencia insurgente em curso no Norte como as crises induzidas pelo clima continuam a agravar os riscos para os segmentos mais frágeis da população, nomeadamente as mulheres, as crianças, e as pessoas deslocadas internamente.

Os abusos contra jornalistas e as restrições de facto à liberdade dos meios de comunicação social e o encerramento da conectividade da Internet móvel na tarde de 25 de Outubro impediram significativamente o acesso à informação numa altura de tensões sociais acrescidas em que a informação credível e fiável era necessária. Em Setembro de 2024, surgiram artigos de imprensa relatando massacres da população local perpetrados pelas forças de segurança moçambicanas nas instalações da TotalEnergies em Afungi em 2021. Na sequência de um pedido de esclarecimento feito pela União Europeia, as autoridades moçambicanas anunciaram uma investigação ao caso.

Acção da UE - principais incidências

Em 2024, a UE continuou a monitorar de perto os direitos humanos em Moçambique, com uma atenção acrescida nas zonas afectadas pela violência insurgente, em particular a província nortenha de Cabo Delgado. A abordagem integrada da UE, que engloba a ajuda humanitária, a cooperação para o desenvolvimento, a consolidação da paz e a segurança, apoiou os esforços das autoridades moçambicanas para enfrentar os desafios humanitários e de segurança em Cabo Delgado, com um forte empenho no respeito pelos direitos humanos e pelo Estado de direito.

A Missão de Formação Militar da UE em Moçambique (EUTM) chegou ao fim em Junho de 2024, tendo cumprido o seu objectivo de formar 11 Unidades das Forças de Reacção Rápida do exército moçambicano (FADM), de acordo com o seu mandato. Para além da formação militar e tática, uma parte substancial do programa de formação da EUTM continuou a centrar-se nos direitos humanos e no Direito Internacional Humanitário, incluindo a protecção de civis, em particular mulheres e crianças afectadas por conflitos armados. Além disso, a UE tem continuado a integrar os direitos humanos nos seus programas de parceria/cooperação, promovendo o desenvolvimento inclusivo, com especial incidência nos direitos das mulheres, das crianças e das pessoas com deficiência. Este apoio traduziu-se, nomeadamente, em assistência financeira, programas de reforço das capacidades e medidas de protecção para os activistas que enfrentam riscos. A UE reforçou visivelmente o seu copromisso na defesa dos direitos humanos e da democracia, defendendo publicamente a protecção da liberdade de expressão e do direito e liberdade de reunião pacífica. A UE continuou a concentrar-se em áreas fundamentais como a consolidação da paz e a boa governação. A luta contra a violência baseada no género foi igualmente objecto de uma atenção especial.

Compromisso político bilateral da UE

A EU reuniu-se com o Governo de Moçambique em Diálogo de Parceria em Maio de 2024. A agenda incluiu os direitos humanos internacionais e o Direito Internacional Humanitário como princípios gerais da abordagem integrada da UE, bem como como os esforços globais para uma paz permanente e um Estado de direito. Antes das eleições de 9 de Outubro de 2024, e a convite das autoridades moçambicanas, a UE enviou uma Missão de Observação Eleitoral que efectuou uma avaliação de todas as fases do processo eleitoral. A missão assinalou que, apesar de uma campanha relativamente calma e pacífica e do dia das eleições, houve falhas e irregularidades em várias fases do processo (recenseamento, contagem e apuramento) que influenciaram negativamente a integridade da eleição e os seus resultados. 

No contexto da eclosão da agitação social na sequência das eleições, a UE também manifestou publicamente a sua posição. O Alto Representante/Vice Presidente emitiu uma declaração condenando o assassinato de duas figuras da oposição em 19 de Outubro. Além disso, o Serviço de Acção Externa da União Europeia emitiu uma declaração apelando ao fim do uso excessivo da força e da repressão violenta das manifestações e instando o Governo a respeitar o direito à manifestações pacíficas e um tweet do Alto Representante sublinhando a necessidade de responsabilização, respeito pelo Estado de direito e transparência no processo eleitoral. A diplomacia discreta também foi utilizada em várias ocasiões para defender a contenção e o diálogo.

A Delegação da UE participou em vários eventos públicos e privados com Organizações da Sociedade Civil que promovem os direitos humanos e as instituições democráticas. Estes compromissos constituíram uma oportunidade para recordar aos grupos-chave e ao público em geral que os direitos humanos e a democracia estão no centro da acção da União Europeia em Moçambique. Em termos de campanhas de sensibilização e divulgação pública, a Delegação continuou a recorrer a mensagens nas redes sociais em datas chave como o Dia Internacional da Democracia, o Dia da Liberdade de Imprensa, o Dia Mundial da Ajuda Humanitária, a Campanha dos 16 Dias contra a Violência baseada no Género e o Dia dos Direitos Humanos. Através de mensagens adaptadas ao público local, a UE destaca o trabalho que realiza tanto em Moçambique como a nível global, procurando assim aumentar a sensibilização para as questões de direitos humanos e para as políticas da UE que sustentam a sua resposta tanto aos desafios internos do país como às tendências globais mais amplas, assegurando assim que a sua divulgação pública permanece relevante, direcionada e eficaz.

Compromisso financeiro da União Europeia

A UE continuou empenhada em proteger centenas de milhares de pessoas afectadas pela violência armada, incluindo os deslocados internos e as comunidades que os acolhem. A UE contribuiu com mais de 22 milhões de euros de ajuda humanitária para a crise de Cabo Delgado, centrando-se na resposta às necessidades mais prementes das populações vulneráveis. As principais áreas de apoio da incluem o acesso a alimentos essenciais, água e saneamento, abrigos, saúde e nutrição, e serviços de protecção. A juventude está no centro da parceria da UE com Moçambique durante o período 2021-2027, nomeadamente através da Iniciativa e-Youth Team Europe, que se centra na educação, capacitação e emprego. No âmbito da sua contribuição para o Fundo de Apoio à Educação, FASE (50 milhões de euros), a UE centrou o seu diálogo político em questões de qualidade e equidade da educação, incluindo a igualdade de género e a inclusão de crianças que vivem em situações de vulnerabilidade. O género continuou a ser uma prioridade transversal da acção da EU em Moçambique, incluindo sobre diálogo políticas e nos programas de cooperação para o desenvolvimento. Tal incluiu acções de apoio à luta contra a Violência baseada no Género.

A UE continuou também a sublinhar a importância da sustentabilidade ambiental através de projectos e programas específicos (por exemplo, o programa PROMOVE Biodiversidade, comércio ilegal de vida selvagem implementado pela WCS, vida selvagem GUARD, NaturAfrica África Austral). Contribuiu também para expandir o envolvimento da sociedade civil na acção ambiental e climática, ao mesmo tempo que cooperava com o Governo moçambicano para melhorar o seu quadro jurídico, assegurando o alinhamento com as normas ambientais internacionais e os compromissos globais. Após o fim do processo de desarmamento e desmobilização, alcançado em 2023, a UE prestou mais apoio à implementação do Acordo de Paz e Reconciliação de Maputo, tanto a nível político como operacional, através do Fundo Comum gerido pelo UNOPS. A UE tem estado activa na oferta de oportunidades de reintegração através de projectos de desenvolvimento. Na sequência de intensas acções de sensibilização e de consultas em apoiadas pela UE, foi adoptada em Abril de 2024 uma nova lei sobre os direitos das pessoas com deficiência.

Contexto multilateral

Moçambique foi membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas para o período de 2023-24 e exerceu a presidência durante Março de 2023 e Maio de 2024. O respeito pelos direitos humanos e pelo Estado de direito é considerado fundamental para a paz e a segurança no manifesto da campanha de Moçambique. Salientando que “a violação generalizada e sistemática dos direitos humanos pode ser uma fonte de conflito”, Moçambique comprometeu-se, nas suas promessas de campanha , a “trabalhar para elevar os padrões de direitos humanos a nível nacional e mundial”. Em Maio de 2024, sob a presidência rotativa deMoçambique, o Conselho de Segurança das Nações Unidas adoptou uma resolução que apela aos Estados para respeitarem e protegerem o pessoal humanitário e funcionários da ONU, de acordo com as suas obrigações ao abrigo do Direito Internacional.

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