A única forma de sairmos juntos da crise é investir numa "Europa Unida"

A procura de cooperação multilateral nunca foi tão grande, mas a oferta não está a corresponder.
Por diversas vezes ao longo da história da Europa, a Alemanha desempenhou um papel crucial ajudando‑nos a superar várias crises. Lembro‑me perfeitamente, por exemplo, da forma como uma anterior Presidência alemã da UE, já em 2007 — era eu então presidente do Parlamento Europeu — ajudou a Europa a chegar a acordo político sobre como avançar, depois de os referendos na França e nos Países Baixos se terem saldado pela rejeição da Constituição. O resultado chama‑se "Tratado de Lisboa", mas a Alemanha desempenhou um papel importantíssimo nesse processo.
Três crises em doze anos
Desde essa altura, enfrentámos a crise financeira, a crise do euro e a crise migratória. Três crises em doze anos é demais para uma União frágil. E a Europa vê‑se agora confrontada com outra crise, muito maior, uma crise existencial.
Temos de superar a crise em todas as suas vertentes, dentro e fora dos nossos países. Chamei a atenção dos embaixadores para o facto de as propostas de recuperação apresentadas pela Chanceler Merkel e pelo Presidente Macron serem ousadas: é disso que a Europa precisa. A pandemia é uma crise simétrica na origem, mas assimétrica nas consequências, uma vez que a capacidade orçamental dos Estados varia imenso. Precisamos, pois, de investir em soluções comuns e de exercer uma verdadeira solidariedade, com base em subvenções e investindo na economia do futuro, na revolução verde e na digitalização.
Este tipo de iniciativa franco‑alemã é mais do que nunca necessário. Mas, ao mesmo tempo, não é suficiente. Temos de conseguir unir a Europa toda.
A necessidade de cooperação multilateral nunca foi tão grande
Tanto no meu discurso como no do Ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Heiko Maas (ligação externa), abordámos a forma como a COVID‑19 está a transformar o nosso mundo, agindo essencialmente como grande acelerador da história e exacerbando as tendências que já antes se faziam sentir. Desde há muito que os analistas falam do fim de um sistema liderado pelos EUA e da iminência de um século asiático. É isso que está agora a acontecer à frente dos nossos olhos.
Frisámos ambos que a procura de cooperação multilateral nunca foi tão grande, mas que a oferta não está a corresponder. Esta é, de facto, a primeira grande crise das últimas décadas em que os EUA não lideram a resposta internacional. Em toda a parte se assiste a um acentuar de rivalidades, especialmente entre os EUA e a China.
Enquanto Europa, temos de assumir as nossas responsabilidades, em termos multilaterais (ainda esta semana informarei o Conselho de Segurança das Nações Unidas do que a UE está a fazer) e na nossa vizinhança.
Durante a Presidência alemã, teremos ótimas ocasiões, como a Cimeira UE‑África ou a reunião de dirigentes UE27‑China, de trabalhar em conjunto para consubstanciar o nosso objetivo de traçar uma orientação geopolítica.
Equipa Europa e "Europa Unida"
Para tudo isso, precisamos de atuar enquanto Equipa Europa, ou "Europa Unida", como lhe chamou o meu amigo Heiko. Tal pressupõe, por sua vez, que entre nós haja confiança e uma base de entendimento comum.
Acontece, porém – vezes demais –, que não conseguimos chegar a um consenso, uma vez que os Estados‑Membros se atêm aos seus ângulos de visão nacionais, em vez de perceberem que há um interesse comum mais vasto. Uma resposta da UE — mesmo que imperfeita aos olhos de alguns Estados‑Membros — é muitas vezes melhor do que um silêncio ensurdecedor.
Além disso, precisamos de recursos eficazes. Se queremos que a política externa da UE produza resultados, todos têm de investir nessa política. Politicamente, mas também financeiramente. Caberá à Presidência alemã chegar a acordo sobre o próximo orçamento da UE.
Neste momento crucial da história da Europa, teremos de investir numa Europa ambiciosa. Uma Europa que proteja os seus povos e o seu modelo: a melhor combinação de liberdade política, prosperidade económica e coesão social em qualquer parte do planeta.
Mais publicações do alto representante da UE, Josep Borrell, no seu blogue
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