Reforço das medidas da UE contra as violações dos direitos humanos

Há um ano, no primeiro Conselho dos Negócios Estrangeiros a que presidi, os ministros dos Negócios Estrangeiros da UE deram o seu acordo político à criação de um novo instrumento da UE que permita processar criminalmente as pessoas que violem gravemente os direitos humanos em qualquer parte do mundo. O caminho foi bastante longo e complexo, como já disse antes num blogue, mas conseguimos alcançar um bom resultado. Este novo regime permite-nos impor sanções independentemente do lugar em que tenham ocorrido as violações e os abusos dos direitos humanos, sem ter de criar novos regimes de sanções específicas para cada país, como tínhamos de fazer até agora. Isto significa que dispomos de novos instrumentos para aumentar a responsabilização e combater a impunidade.
Como dizemos frequentemente, os direitos humanos fazem parte do ADN da União Europeia. Porém, como podemos defendê-los num mundo em que o respeito por esses direitos está a retroceder incontestavelmente? Todos os dias, em diferentes partes do mundo, a UE e os seus Estados-Membros trabalham de forma concreta sobre este tema. Estamos presentes no terreno enviando observadores a julgamentos e a eleições, apoiando os defensores dos direitos humanos e colocando-os fora de perigo, colaborando em projetos para promover os direitos das mulheres e apoiando a sociedade civil.
Porém, todos conhecemos a dura realidade do mundo atual. Apesar dos nossos esforços incansáveis, a escravatura, as crianças-soldados, a tortura, o assassinato de civis, o tráfico de seres humanos e muitos outros crimes continuam a ocorrer todos os dias. O mundo está cheio de exemplos: na República Democrática do Congo, bem como noutros países, as mulheres são vítimas de violência sexual generalizada devido ao conflito que assola o país; na Síria, no Afeganistão, no Iémen e noutros países, famílias inteiras são forçadas a abandonar as suas casas devido aos conflitos; em muitos países, mulheres e homens corajosos definham na prisão por terem ousado exprimir a sua opinião; todos testemunhámos como, na Bielorrússia, os manifestantes pacíficos são vítimas de uma violenta repressão.
Ir mais além das resoluções e declarações: ações da UE em apoio aos direitos humanos
Quando tal acontece, a UE tem de ir além da adoção de resoluções e de declarações — temos de agir. Já utilizamos acordos comerciais, missões de observação eleitoral, missões de gestão de crises, diálogos sobre direitos humanos e a adoção de orientações para abordar estas questões no terreno. A UE pode também responder às violações dos direitos humanos suspendendo a ajuda ao desenvolvimento (como fizemos no caso do Burundi) ou retirando as preferências comerciais «Tudo Menos Armas» (suspensas temporariamente no caso do Camboja).
E em seguida vêm as sanções. Desde há vários anos, a UE utiliza este instrumento para combater as violações e os abusos dos direitos humanos. Recorremos à proibição de vistos, ao congelamento de bens e a outras medidas, como a proibição da venda de armas e de equipamento utilizado para fins de repressão interna, para visar as pessoas e as entidades responsáveis. Foi o que fizemos, por exemplo, no caso da Líbia, da Venezuela, da Bielorrússia, da RDC e de Mianmar.
«Deixa de ser necessário chegarmos a acordo sobre um quadro de sanções específicas para cada país no qual sabemos que ocorrem violações, o que nos fará ganhar um tempo precioso.»
Há um ano, decidimos que chegou o momento de dar mais um passo: elaborar um regime de sanções de âmbito verdadeiramente global. Este trabalho já está a dar resultados.
O novo regime global de sanções da UE em matéria de direitos humanos não será limitado por fronteiras nem será específico de cada país. Tal permitir-nos-á visar os intervenientes estatais e não estatais, independentemente do local onde se encontrem e do facto de cometerem violações e abusos no seu próprio país ou noutro país. Deixa de ser necessário chegarmos a acordo sobre um quadro de sanções específicas para cada país no qual sabemos que ocorrem violações, o que nos fará ganhar um tempo precioso.
O novo regime incluirá uma derrogação específica, que permite aos Estados-Membros conceder uma autorização aos operadores humanitários para poderem garantir que a população civil não sofra devido ao comportamento dos seus dirigentes.
Que perspetivas?
A adoção do regime global de sanções da UE em matéria de direitos humanos constitui um marco importante, mas o nosso trabalho não acaba aqui. Devemos agora decidir de que modo o utilizar para que seja o mais eficaz possível e que casos concretos devem figurar na lista. Embora tanto os Estados-Membros como eu próprio como alto representante possamos apresentar propostas, cabe aos Estados-Membros decidir, por unanimidade. Não é segredo que eu propus a votação por maioria qualificada para nos permitir tomar decisões mais rápidas sobre a inclusão de casos concretos na lista de intervenções, mas nem todos os Estados-Membros concordaram com esta proposta.
Qualquer decisão sobre a inclusão na lista será, sem dúvida, um exercício delicado em que temos de avançar com cautela Mas uma coisa é certa: teremos de dar provas, desde o início, da nossa determinação política de utilizar este novo regime e de dispor de listas fundamentadas e juridicamente sólidas.
Num mundo em que alguns procuram repudiar ou redefinir o caráter universal dos direitos humanos, a UE deve ser mais do que uma força moral. Temos que ser mais firmes e agir. Como escreveu o poeta irlandês Seamus Heaney, temos de «criar um sistema de amplificação mundial para todos aqueles cuja voz é praticamente inaudível». Para o fazer, precisamos deste regime global de sanções da UE em matéria de direitos humanos.
Em suma, muito dependerá da forma como, coletivamente, decidirmos utilizar este novo instrumento. Mas, de qualquer modo, demos um sinal aos autores de violações dos direitos humanos a nível mundial: a partir de agora a UE pode atuar mais firmemente em matéria de direitos humanos.
http://twitter.com/JosepBorrellF/status/1336031853426470917
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