Bielorrússia: a violência tem de acabar e o regime tem de mudar

"Apelamos com veemência às autoridades bielorrussas para que ponham termo à violência, libertem todas as pessoas detidas arbitrariamente e estabeleçam um diálogo aberto com a sociedade."
A Europa quer manter relações mutuamente benéficas com os seus vizinhos orientais
Após a Guerra Fria, que dividiu os europeus durante mais de quarenta anos, e o período de instabilidade que se seguiu ao desmembramento da antiga URSS, o desenvolvimento de relações mutuamente benéficas com os nossos vizinhos a oriente tem sido um dos principais objetivos da política externa europeia. Há onze anos que a União está empenhada numa Parceria Oriental ambiciosa com seis países da região, incluindo a Bielorrússia.
Com 9,5 milhões de habitantes, a Bielorrússia é um vizinho direto da Polónia, da Letónia e da Lituânia e um elemento fundamental da nossa política de vizinhança. No entanto, as relações entre a União Europeia e este país sem litoral só poderão desenvolver‑se plenamente uma vez que os direitos humanos fundamentais e as regras básicas da democracia forem respeitados. Infelizmente, até à data, muitas têm sido as vezes em que não foi isso que aconteceu.
"A Bielorrússia, vizinha direta da Polónia, da Letónia e da Lituânia, é um elemento fundamental da nossa Parceria Oriental"
Alexander Lukashenko chegou ao poder na Bielorrússia em 1994, quando o país ascendeu à independência pela primeira vez na história. Nos anos seguintes, as liberdades fundamentais e os princípios democráticos foram manifestamente ignorados e violados, o que levou a UE a tomar medidas restritivas contra o regime após as eleições de 2010.
Uma trajetória mais positiva desde 2015
No entanto, em 2014 e 2015, as autoridades bielorrussas assumiram um papel construtivo na crise ucraniana, recusando‑se a apoiar as sanções impostas pela Rússia à Ucrânia e facilitando a celebração dos chamados acordos de Minsk I e II. A subsequente libertação dos presos políticos, em agosto de 2015, permitiu nessa altura à União levantar a maior parte das medidas restritivas em vigor. Desde então, assistimos a uma trajetória mais positiva das nossas relações e a Bielorrússia tem tido uma participação mais ativa na Parceria Oriental.
A União Europeia tomou uma série de medidas de apoio económico e de cooperação, designadamente por intermédio do Banco Europeu de Investimento (BEI) e do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD). Ajudámos também o país a preparara sua adesão à Organização Mundial do Comércio (OMC). Entre 2014 e 2020, foram atribuídos mais de 170 milhões de euros à Bielorrússia, a título do Instrumento Europeu de Vizinhança e Parceria. Foram criados vários programas de intercâmbio dirigidos aos jovens, investigadores e profissionais com o objetivo de intensificar os contactos interpessoais. Em julho deste ano, entrou em vigor um acordo que visa facilitar a concessão de vistos da UE aos cidadãos bielorrussos. As últimas medidas restritivas ainda vigentes deveriam expirar em fevereiro de 2021.
Potenciais candidatos impedidos de participar
Infelizmente, nos últimos meses, registou‑se uma deterioração gradual do processo e dos direitos democráticos no período que antecedeu as eleições presidenciais. Potenciais candidatos foram detidos ou impedidos de participar devido a medidas restritivas de motivação política. Intensificou‑se a repressão contra opositores políticos e meios de comunicação social independentes, bloguistas e ativistas.
Ao contrário do que se tinha verificado em eleições anteriores, as autoridades não convidaram a OSCE em tempo útil a enviar observadores para acompanharem as eleições. Manifestámos reiteradamente a nossa inquietação perante tais violações (ver aqui, aqui ou aqui).
O regime tinha vindo a endurecer‑se nas últimas semanas devido ao surto de COVID‑19 e às suas profundas consequências económicas e sociais. A pandemia atingiu o país de forma particularmente dura, também porque as autoridades bielorrussas não a levaram a sério logo desde o início.
"A deterioração do clima político culminou em eleições que não foram livres nem justas e numa onda de violência repressiva."
A deterioração do clima político culminou em eleições que não foram livres nem justas. Seguiu‑se uma onda de violência repressiva, quando o povo da Bielorrússia demonstrou corajosamente a sua desconfiança quanto aos resultados anunciados e o seu desejo de mudança.
Esta situação provocou pelo menos uma vítima mortal, vários feridos e a detenção arbitrária de milhares de pessoas, incluindo jornalistas, assim como a repressão dos direitos fundamentais de expressão, nomeadamente um bloqueio da Internet. Svetlana Tikhanovskaya, a candidata da oposição com maior apoio, que substituiu o marido ainda preso, foi obrigada a refugiar‑se na Lituânia.
Tal como afirmei na minha declaração de terça‑feira, em nome da União e dos seus Estados‑Membros, apelamos com veemência às autoridades bielorrussas para que ponham termo à violência, libertem todas as pessoas detidas arbitrariamente e regressem sem demora à via do correto comportamento democrático e pluralista, encetando o diálogo com a sociedade.
Repensar as relações com a Bielorrússia
Caso contrário, teremos de repensar as nossas relações com a Bielorrússia e, em última análise, adotar sanções contra os responsáveis pelos atos de violência, pelas detenções arbitrárias e pela falsificação dos resultados eleitorais. Esta questão será debatida na sexta‑feira, dia 14, durante o Conselho dos Negócios Estrangeiros extraordinário que convoquei. Apoiamos, obviamente, a soberania e a independência da Bielorrússia, mas não podemos prosseguir as nossas relações ignorando as flagrantes violações dos direitos humanos e das liberdades políticas.
"A UE defende a democracia e os direitos humanos em todo o lado e temos de impedir que esses valores sejam postos em causa"
A UE é uma comunidade baseada em valores: para além do caso da Bielorrússia, defendemos a democracia e os direitos humanos em todo o lado. Temos de impedir que estes valores sejam postos em causa; uma tendência que, infelizmente, nos últimos anos observamos num número crescente de países.
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